Marcos Aurélio S. Souza
Estrelas miudinhas, coloridas, faz cosquinha em todo meu corpo, até no fundo da espinha. É sempre assim: maconha me faz bem, a pedra me faz feliz. Deixa pedra pra lá...
O Carioca perdeu o tempo das coisas. Caralho, porque ele não aplicou uma coronhada naquela puta. O jeito é investir numa taurus de verdade, assim a gente queima logo neguinho e branquinho, não conta conversa. Esse viadinho, menino do Rio, com esse papo de teatro, pistolinha da Estrela, vou botar ele pra subir na minha, ele vai ver o que é bom pra tosse! Teve vida boa lá no Rio, com certeza, deve ter estudado em escola privativa, sei muito bem que a mãe era enfermeira formada. Leva uma grana boa no final do mês. Ver na pinta que dormiu de edredom na vida, esse rebelde sem causa.
Vacilou... Eu preto, ele branco, ver se isso presta. Boto logo pra pegar no pesado. Eu fico no tempra e ele vaza na pedreira, pega o berro e bota o terror. Aqui não tem isso de preto sempre o bicho mau, ele pega o disfarce de branquinho gracioso, e vai pra cima, eu abro ala atrás e rabio depois. Tá ligado que eu sei a ficha dele todinha. Binha trabalhou um tempão com Dona Clotildes, a avó dele, gente boa. De noite, quando a gente se encontrava, ela me passava tudo, até a história do tio traficante, dominando as bombas da Disneylandia, em Contagem. Tristeza dupla pra velha, com perna estourada de diabete.
Ela agora vivendo miséria com o neto no crime. Se não fosse eu pra colocar ele nos trilho das mina de ouro, pagar hospital pra ela, ia ficar de chupeta no sinal, levando paletada na cara. Eu que não quero mais essa vida de malabares em trânsito, limpar vidro de ninguém. Vou deixar boyzinho com vista embaçada mesmo. Se puder, escureço mais. Depois daquele velho, num toyota corolla, dizendo que ia me levar pro Picolino. Binga, o baleiro, me gritando. Fiquei desconfiado. Vou deixar coroa comer meu rabo? Nunca paguei pau de cabrito na faculdade do crime, não é aqui fora que vou fazer isso. Lá ele.
Agora ele fica nessa de ser preto, ouvindo Racionais, dizendo que vive o mesmo negro drama que eu. Dia desses pedi pra contar quantos branquinhos como ele penava no sinal. Saímos no tempra do Santo Antônio, depois de um arrumadinho, descemos Cidade Baixa, Calçada, passamos pelo porto, antes da feira de São Joaquim, dois pretinhos, o menor devia ter três anos, o maior cinco, no máximo. Seguimos em direção ao Mercado Modelo, a pivetada pulando no mar, uma multidão preta esmolando turista. Subimos em direção a Barra, meninada vendendo biscoito, uma pretinha de uns doze se insinuando atrás de gringo. Seguimos orla todinha, só vimos preto no sinal. Na Manoel Dias, um miserê, a negrada concentrada, lembrei logo de minha mãe. Dona Lourdes, 57 anos hoje, mirrada, 47 quilos de osso e sofrimento, morando em Camaçari com meu irmão, aquele que envergonhou família e foi ser polícia.
Na praia, no nosso encontro de negócios, orgulho do meu discurso, eu plantei a real para o Carioca: “Viu isso: eu não estudei história como você, mas sei que essa cidade nunca foi boa pra preto. Sua estadia na FEBEM do Rio não te dá credencial pra tirar onda em cima de baiano. Aprende logo a manejar arma de fogo, aqui também a miséria é negra, tem caveirão, complexo de alemão e o escambau. Quebro seus dentes como já fiz uma vez. Matei um amigo na Baixa da Égua, porque tirou onda e me chamou de Barriguinha, mato você também”. Meu nome é Donga, porra!
Carioca tem olhar de boi manso, dá pena.
Amigo MArcos,
ResponderExcluirEstou seguindo seu blog.PAssarei aqui para saber notícias do mundo e literárias. Divulgue o nosso recenteblog sobre redação.Abç